Políticas patrimoniais e projetos nacionalistas: línguas e brasilidade em tela

SEVERO, Cristine Gorski;

Resumo:

As políticas de preservação dos bens culturais no Brasil desempenham um papel político na construção de um imaginário de nação e de nacionalismo, no embalo de outras políticas que buscam demarcar simbolicamente os limites do Estado Nacional (TRAJANO, 2012). Embora tais políticas visem um fortalecimento desse simbolismo nacional, elas também respondem às demandas das políticas internacionais de patrimonialização vinculadas à UNESCO. Tendo em vista essa dupla face – externa e interna – das políticas de patrimonialização, o presente capítulo pretende discutir o papel desempenhado pelas línguas nas práticas de patrimonialização a partir de uma perspectiva historiográfica e política. A discussão se enquadra na área de políticas linguísticas e dialoga com as iniciativas estatais contemporâneas de reconhecimento da diversidade linguística brasileira. Busca-se neste texto problematizar o interesse recente do Estado, a partir dos anos 2000, pela preservação da diversidade linguística à luz de um projeto governamental que, em grande medida, opera de forma verticalizada (top-down), estabelecendo, muitas vezes, diálogos frágeis ou quase inexistentes com as comunidades linguísticas envolvidas. O texto discute o conceito de língua das políticas de patrimonialização e as contradições que tais conceitos enfrentam ao lidar com as práticas linguísticas reais e concretas. Além disso, indaga-se a respeito do papel desempenhado pelos saberes especializados – a Linguística – na produção de políticas estatais.O capítulo se estrutura da seguinte maneira: inicialmente discute-se o conceito de patrimonialização a partir de instâncias nacionais, com enfoque na criação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN (Ministério da Cultura), pontuando o papel da patrimonialização na construção de um discurso nacional; em seguida, apresenta-se um panorama das iniciativas políticas patrimoniais, explícitas e implícitas, em torno da língua, em diálogo com as esferas internacionais; por fim, problematiza-se o conceito de língua dessas políticas patrimoniais em face das ideias de política e de cultura que veiculam.

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DOI: 10.5151/9788580391466-09

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Como citar:

SEVERO, Cristine Gorski; "Políticas patrimoniais e projetos nacionalistas: línguas e brasilidade em tela", p. 189 -204. In: Sociolinguística e Política Linguística: Olhares Contemporâneos. São Paulo: Blucher, 2016.
ISBN: 9788580391466, DOI 10.5151/9788580391466-09